Cansei-me de olhar para um céu sem arcos onde só
pairam nuvens de espuma passageiras, gotas de água sopradas por ventos que se
evaporam com receio de alterar o silêncio dos azuis. Há pouco tempo reparei que
no céu vivia um perfeito arco-íris, como só a natureza pode criar.
As estátuas do lago apreciam a escuridão caridosa
que as protege de todas as preocupações. Para elas, tudo terminou como a casa
de Álvaro, tudo se transformou em escombros onde deixou de existir o bem, onde
deixou de existir o mal. Tudo terminou, e tudo devia ter passado a ser bem mais
simples, mas assim não aconteceu.
As águas do lago estão bem escuras nesta noite de
lua nova.
Nos meus sonhos consigo viajar até às profundezas do
lago onde habitam as estátuas, mas ainda não sei que perguntas lhes posso
fazer. Será que falam, será que estão acordadas ou será que estão para sempre
dominadas por aquela espécie de coma perpétuo que as ilumina? Vivem num
silêncio tão sereno que não consigo imaginar o que fazer ao reencontrá-las. Tudo
é muito diferente nas profundezas desse lago onde se arquivam as memórias. Nos meus
sonhos deixo-me levar até lá, mesmo que seja a mais escura das madrugadas de uma
qualquer noite de lua nova. Concebo os pequenos sinais que me chegam, sem aviso,
dessas profundezas escuras, compreendo as alterações mais discretas das suas correntes
e até as oscilações mais discretas que as perfumam.
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