segunda-feira, 22 de setembro de 2014

03 - O SILÊNCIO DAS ESTÁTUAS



Cansei-me de olhar para um céu sem arcos onde só pairam nuvens de espuma passageiras, gotas de água sopradas por ventos que se evaporam com receio de alterar o silêncio dos azuis. Há pouco tempo reparei que no céu vivia um perfeito arco-íris, como só a natureza pode criar.
As estátuas do lago apreciam a escuridão caridosa que as protege de todas as preocupações. Para elas, tudo terminou como a casa de Álvaro, tudo se transformou em escombros onde deixou de existir o bem, onde deixou de existir o mal. Tudo terminou, e tudo devia ter passado a ser bem mais simples, mas assim não aconteceu.
As águas do lago estão bem escuras nesta noite de lua nova.
Nos meus sonhos consigo viajar até às profundezas do lago onde habitam as estátuas, mas ainda não sei que perguntas lhes posso fazer. Será que falam, será que estão acordadas ou será que estão para sempre dominadas por aquela espécie de coma perpétuo que as ilumina? Vivem num silêncio tão sereno que não consigo imaginar o que fazer ao reencontrá-las. Tudo é muito diferente nas profundezas desse lago onde se arquivam as memórias. Nos meus sonhos deixo-me levar até lá, mesmo que seja a mais escura das madrugadas de uma qualquer noite de lua nova. Concebo os pequenos sinais que me chegam, sem aviso, dessas profundezas escuras, compreendo as alterações mais discretas das suas correntes e até as oscilações mais discretas que as perfumam.

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