Água, conchas, areia e mais algumas estrelas do mar
escorrem pelo interior das paredes húmidas do globo. Acompanharam a jovem
quando a esfera resolveu obedecer ao apelo do marinheiro. As estrelas do mar
gostam de vir até aqui para crescer. Buscam alimento no interior deste objeto
gigantesco.
A esfera descreve uma curva apertada à direita e
desenha um arco pronunciado ao contornar mais uma colina rochosa. Contorce-se e
derrapa, na mesma direção, de maneira quase descontrolada.
- AI! Quem me dera não te ter visto a desandar assim
a esta velocidade estonteante. Se tivesses corrido a esta velocidade quando o
tubarão me atacou, talvez o animal não tivesse conseguido provar as minhas
carnes.
A jovem fica surpreendida com o tom do desabafo de
Álvaro, e procura acalmá-lo:
- Deita-te, marinheiro, ainda estás fraco para te
levantares. Aqui dentro é mais complicado mantermos o equilíbrio enquanto a
esfera vai rolando. Ainda estamos longe dessa cidade que pretendes visitar. Se
preferires, podes sentar-te, mas descansa, por favor. O mais importante é estarmos
a salvo dos animais mais perigosos que lá fora varrem o fundo do mar.
A menina está imóvel quando começa a sentir uma
brisa gelada levantar-se por cima dela e um redemoinho a puxá-la para baixo.
Uma aflição na garganta impede-a de gritar, e ela
cai, cai, e cai, arrastada pelas águas que entraram do fundo da esfera que
rodopia. A jovem jura ver algumas cabeças de pedra a mirá-la, invejosas, pois
ela deixou de ser estátua como elas. A esfera é composta por estátuas, esta
casa redonda onde se abrigam é uma escultura ajeitada com corpos feitos de
pedra e forrados a coral. Por um breve instante o corpo da rapariga ganha de
volta o seu peso em pedra e prepara-se para se fundir com as outras estátuas que
ajudam o marinheiro a enfrentar e viajar pelas profundezas do oceano. Álvaro
sente as estrelas do mar que lhe impedem a fluidez dos movimentos da perna e só
a muito custo consegue enfrentar os movimentos mais bruscos da esfera. A bola
prepara-se para lhe roubar a companhia. A jovem está agora mais próxima do teto
do que do chão do grande globo pois ela vai acompanhando os movimentos
giratórios desta esfera que a convoca.
O marinheiro está fraco mas sabe que tem de
intervir. Torce-se e contorce-se, geme enquanto agita os braços no ar para a
tentar alcançar. Metade do corpo da jovem voltou a transformar-se na mesma
pedra em que fora esculpida.
- Acorda, reage, não te deixes transformar! –
grita-lhe Álvaro enquanto a tenta agarrar. – Pensa no tempo que passaste transformada
em pedra, pensa que és de carne e osso, pensa depressa para travares essa
transformação! Pensa, pensa agora antes que as coisas voltem a ser como eram
antes.
A rapariga tenta mas não consegue reagir. Não
consegue. Tenta, mas já mal consegue escutar as palavras do amigo marinheiro.
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